História Universal do Sushi

Um ensaio sobre valores em torno da gastronomia

Um projecto de Alvaro García de Zúñiga e Teresa Albuquerque


Nota de Intenções


Reunir-se à volta da comida é um acto universal. Com maior ou menor grau de sofisticação cada cultura transforma o acto de comer numa espécie de ritual, no qual – quando se alcançou um nível de prosperidade que o permite – se torna mas importante o aspecto formal do que propriamente alimentar-se.

A "Historia Universal do Sushi" pretende ilustrar estes aspectos e ser um suporte que leve o espectador à reflexão sobre o que está por detrás do simples facto de comer.


Portugal


Para os portugueses o Japão e a sua cultura tem um atractivo muito especial.

Portugal foi o primeiro país ocidental a desenvolver contactos com o Japão, em 1543, e tanto portugueses como japoneses guardaram desse contacto numerosos testemunhos inscritos nas suas próprias línguas.

Apesar de intensas no século XVI as relações entre Portugal e o Japão ficaram, de algum modo paradas no tempo.

Embora a presença portuguesa no Japão seja hoje da ordem do simbólico, existem nesse país vários jornais de língua portuguesa e até canais de televisão que transmitem na língua de Camões.


Brasil


Mas tudo isto se deve ao Brasil. São os brasileiros que mantêm laços fortes com o Japão. O que é lógico se pensarmos que S. Paulo é a cidade do mundo onde, fora do Japão, vive o maior número de japoneses, fruto duma emigração que começou há quase cem anos, em 1908; E que descendentes desses japoneses regressaram à terra dos seus antepassados formando hoje uma colónia de cerca de 300.000 pessoas. No Brasil a comunidade japonesa ultrapassa o milhão.

Estes intercâmbios já produziram vários frutos gastronómicos. No Brasil, e especialmente em S.Paulo, sushi e sashimi fazem parte do quotidiano há já muito, e pensando bem seria até possível imaginar Chico Buarque falar do “sushi tropical”. Dito isto as visões do mundo de um itamae japonês ou de um seu colega brasileiro podem ser muito diferentes.


Japão


Os aspectos rituais da gastronomia japonesa estendem-se para além daquilo a que estamos habituados. Desde os banquetes de casamento, passando pelos dias das crianças e por muitas outras celebrações, como essa, surpreendente, do templo Sojiji, perto de Tóquio, onde, cada ano se canta e se reza pelos milhões de peixes que alimentaram a Nação (e no dia seguinte se vai de barco até à baía de Tóquio, para homenagear desta vez os peixes mortos de causas naturais). O ritual gastronómico japonês, como nenhum outro, convida à reflexão.


Triângulo e Dualidade


As relações do triângulo Portugal-Japão-Brasil são o tema central deste documentário que sempre à roda do sushi, desenvolverá uma reflexão sobre a(auto?)exclusão de Portugal desta relação tri-lateral.

Em 1585, o jesuíta Luís de Fróis (1532 - 1597) escreveu um texto singular: “Tratado sobre as contradições & diferenças de costumes entre os Europeus & os Japoneses”, no qual são tratadas como iguais, embora simetricamente opostas, as duas culturas. Como se se tratasse de uma imagem reflectida num espelho, semelhante e distinta ao mesmo tempo.

Junichirô Tanizaki, no seu célebre ensaio “Elogío da Sombra” (1933), parte da universalidade do branco para reflectir sobre até que ponto certos princípios que consideramos evidentes e supomos naturais, são, na realidade culturais. A questão para Tanizaki é, através do jogo entre a luz e a sombra, compreender as duas civilizações : a ocidental e a japonesa.

A luz ocidental é uma força que tudo esmaga e submete. Daí que a luz seja entendida como o equivalente da verdade, uma verdade que se crê a si própria de ordem ontológica.

A oposição entre sombra e luz surge como a oposição entre meditação e reflexão.


Sobre a forma


A "História Universal do Sushi" será um documentário e não uma reportagem : o aspecto estético será particularmente privilegiado. O tratamento da imagem será tão simples e depurado como um sushi.

A música tradicional e popular japonesas (Noh, sarugaku, dengaku - literalmente “música dos campos de arroz”) dará o tom, mas a esta virão acrescentar-se outras : o quarteto de cordas japonês Casals a interpretar o fado “Foi Deus” algumas peças de John Cage para vegetais e derivados como “Ryoanji” e “Branches”, sem esquecer a nova música popular brasileira…

A participação, reflexões e até devaneios de artistas, intelectuais e itamaes do Japão, do Brasil e de Portugal, constituirão o eixo que conduzirá a nossa forma particular de contar esta história.

Entre restaurantes e jardins Zen, propomos reflectir com eles sobre o sushi e sobre o mundo.


Sobre a oportunidade


O Kasato-Maru, navio a vapor que trouxe os primeiros 781 emigrantes japoneses ao Brasil, chegou ao Porto de Santos no dia 18 de Junho 1908. Esta data é celebrada todos os anos pela comunidade japonesa do Brasil.

Em 2008 festeja-se em grande pompa, em S.Paulo, o primeiro centenário desta comunidade. Também em 2008, no Rio de Janeiro celebram-se outras comemorações: o bi-centenário da chegada da Corte portuguesa a esse país, fugindo das invasões francesas. Mais uma vez a História cruza, sem que se toquem, os três vértices dos nosso triângulo.

TAAGZ



H.U.S.
Projecto de Desenvolvimento (ICA)

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