Oswald de Andrade


Selecção de Poesia



Pronominais


Dê-me um cigarro

Diz a gramática

Do professor e do aluno

E do mulato sabido

Mas o bom negro e o bom branco

Da Nação Brasileira

Dizem todos os dias

Deixa disso camarada

Me dá um cigarro


Vício na fala


Para dizerem milho dizem mio

Para melhor dizem mió

Para pior pió

Para telha dizem teia

Para telhado dizem teiado

E vão fazendo telhados


O gramático


Os negros discutiam

Que o cavalo sipantou

Mas o que mais sabia

Disse que era

Sipantarrou.


Erro de português


Quando o português chegou

Debaixo de uma bruta chuva

Vestiu o índio

Que pena!

Fosse uma manhã de sol

O índio tinha despido

O português.


Metalúrgica


1300° à sombra dos telheiros retos

12000 cavalos invisíveis pensando

40 000 toneladas de níquel amarelo

Para sair do nível das águas esponjosas

E uma estrada de ferro nascendo do solo

Os fornos entroncados

Dão o gusa e a escória

A refinação planta barras

E lá embaixo os operários

Forjam as primeiras lascas de aço


Cidade


Foguetes pipocam o céu quando em quando

Há uma moça magra que entrou no cinema

Vestida pela última fita

Conversas no jardim onde crescem bancos

Sapos

Olha

A iluminação é de hulha branca

Mamães estão chamando

A orquestra rabecoa na mata


Bonde


O transatlântico mesclado

Dlendlena e esguicha luz

Postretutas e famias sacolejam


Fotógrafo Ambulante


Fixador de corações

Debaixo de blusas

Álbum de dedicatórias

Marquereau


Tua objetiva pisca-pisca

Namora

Os sorrisos contidos

És a glória


Oferenda de poesias às dúzias

Tripeça dos logradouros públicos

Bicho debaixo da árvore

Canhão silencioso do sol


a europa curvou-se ante o brasil


7 a 2

3 a 1

A injustiça de cette

4 a 0

2 a 1

3 a 1

E meia dúzia na cabeça dos portugueses


biblioteca nacional


A Criança Abandonada

O Doutor Coppelius

Vamos Com Ele

Senhorita Primavera

Código Civil Brasileiro

A arte de ganhar no bicho

O Orador Popular

O Pólo em Chamas


meus oito anos


Oh que saudades que eu tenho

Da aurora de minha vida

Das horas

De minha infância

Que os anos não trazem mais

Naquele quintal de terra

Da Rua de Santo Antônio

Debaixo da bananeira

Sem nenhum laranjais


Eu tinha doces visões

Da cocaína da infância

Nos banhos de astro-rei

Do quintal de minha ânsia

A cidade progredia

Em roda de minha casa

Que os anos não trazem mais


Debaixo da bananeira

Sem nenhum laranjais


Barricada


Todos os passarinhos da Praça da República

Voaram

Todas as estudantes

Morreram de susto

Nos uniformes de azul e branco

As telefonistas tiveram uma síncope de fios

Só as árvores não desertam

Quando a noite luz


Alerta


Lá vem o lança-chamas

Pega a garrafa de gasolina

Atira

Eles querem matar todo amor

Corromper o pólo

Estancar a sede que eu tenho doutro ser

Vem do flanco, de lado

Por cima, por trás

Atira

Atira

Resiste

Defende

De pé

De pé

De pé

O futuro será de toda a humanidade


Relógio


As coisas são

As coisas vêm

As coisas vão

As coisas


O Hierofante


Não há possibilidade de viver

Com essa gente

Nem com nenhuma gente

A desconfiança te cercará como um escudo

Pinta o escaravelho

De vermelho

E tinge os rumos da madrugada

Virão de longe as multidões suspirosas

Escutar o bezerro plangente


Longo da Linha


Coqueiros

Aos dois

Aos três

Aos grupos

Altos

Baixos


poetas do modernismo brasileiro

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